Alimentar o amor

Segundo o estudo da Fundação Francisco Manuel do Santos ‘As mulheres em Portugal, hoje: quem são, o que pensam e como se sentem’, no topo do ranking das características do companheiro segundo a sua capacidade de tornar as mulheres muito felizes com a relação do casal está a ‘Partilha das tarefas domésticas’. No entanto, os casais portugueses estão longe de ter uma relação simétrica no que a isto diz respeito. Nos casais em que a mulher tem trabalho pago, 72% das tarefas domésticas são asseguradas pelas mulheres, assim como 69% dos cuidados com os filhos. Achámos por bem celebrar o Dia dos Namorados partilhando um texto do associado da Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto (APDMGP), Nuno Pires, na primeira pessoa, acerca do papel do homem no apoio à amamentação: um exemplo de uma tarefa que não pode ser dividida entre homens e mulheres – ou será que pode?

“Vou apenas falar da minha experiência e ideias, há excelentes mães e pais que optam por não amamentar, seja porque razão for. Defendo o direito de escolha e em especial o respeito por essa escolha. Também defendo que as escolhas devem ser informadas e conscientes, sejam elas quais forem.

Hoje em dia, um pai (ou companheiro/a), mais do que apoiar a amamentação com tarefas, como refere a OMS, tem de se informar do porquê de amamentar, e de como deve ser feita a amamentação.

Não é suficiente ir atrás da procissão: “é uma cena dela, ela sabe o que é melhor”…

Garantidamente (e infelizmente) vai aparecer aquele pediatra ou profissional de saúde, aquele vizinho, aquele amigo ou familiar a falar do leite secar ou ser fraco, de “só se pode deixar mamar 15 minutos em cada mama”, do “a mama não é chucha!” – como se a chucha não fosse uma imitação barata da mama da mãe -, o que diz “o leite adaptado é melhor, tem isto e aquilo!”, “de noite não podes dar mama, senão fica mal habituado e depois vais ver!!”, “é normal doer, tens que aguentar, a mim também me doeu, é mesmo assim!”, etc etc etc

É o pai que nesses momentos deve impedir esses comentários, ou pelo menos controlá-los e ajudar a mãe a lidar com medos e inseguranças que possam gerar.

Não chega andar a reboque, é curto, e a nossa família merece mais dedicação, mais amor.

Não chega, porque nos momentos maus, quando as inseguranças vencerem por um minuto, ficamos sem armas para defender o que sabemos racionalmente que queremos e é melhor para a nossa família, mas a irracionalidade teima em não nos largar.

Na gravidez, parto e pós parto, o pai é o guardião, é o protetor da família, o defensor da sua companheira e da sua cria, e para mim, esse é um dos papéis mais importantes na vida de um homem, não de uma forma machista, mas sim de puro companheirismo e apoio, feito sem  destaque, nos bastidores, mas de impacto profundo no relacionamento do pai com a sua família.

Sei como é fácil sentirmo-nos “atirados para o lado”, sem saber o que fazer, colocados em segundo plano pela Natureza, onde apenas servimos para tarefas corriqueiras e que qualquer um poderia fazer, e com esse pensamento a invadir-nos durante a gravidez e o nascimento, apoiado por uma sociedade que desvaloriza e de certa forma até condena o que eu considero o verdadeiro papel do pai, é fácil desligarmos a ficha e entrarmos na onda do “se precisares de alguma coisa, diz!” como máscara do sentimento de exclusão que sentimos por nada disto se passar no nosso corpo, nem sermos ouvidos nas nossas opiniões, pois “os homens sabem lá”…

Cabe em primeiro lugar aos pais, e logo de seguida às mães – se a porta estiver trancada, fica muito mais difícil o pai entrar…- lutarem pelo verdadeiro lugar do pai na família, e assim formarem verdadeiras famílias de amor.

Talvez um dia, não seja preciso lutar tanto assim para o fazer…

Podem discordar, concordar, negar ou partilhar das minhas ideias, mas em todo o caso se servir para refletirem um pouco sobre o papel do pai, fico mesmo muito feliz!

E agora, vou limpar o cocó à minha filha, e pôr-lhe um ganchinho para a “guedelha” não andar sempre a atrapalhar enquanto jogamos à bola!”

Nuno Pires ~ Pai a tempo inteiro; facilitador do PBM* Porto e Penafiel; associado da APDMGP

* Positive Birth Movement

Um comentário em “Alimentar o amor

  1. Parabéns pelo seu artigo! Já é tempo dos pais deste país se “chegarem à frente” e reclamarem a posição fundamental que têm na família… já lá vai o tempo que cuidar e educar os filhos era “coisa das mulheres”!
    Apenas acrescentaria que a proximidade/ acompanhamento do pai no período pré-natal, parto e pós-parto é essencial para a adaptação ao seu papel de pai, ao seu processo de transição de tornar-se pai… O pai faz parte da tríade pai-mãe-bebé, é muito mais que um guardião ou companheiro… é igualmente responsável pelos cuidados e educação dos filhos, no exercício pleno da sua paternidade.

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