Tomada de posição da APDMGP em relação à possibilidade de alterações à Orientação 2/2023 da Direção-Geral da Saúde

A Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto (APDMGP) reconhece e congratula a comissão criada pela Direção-Geral da Saúde (DGS) pelospontos positivos existentes na Orientação 002/2023 publicada no dia 10 de maio de 2023.

No entanto, a APDMGP está preocupada com a proposta de alteração desta Orientação por parte da Ordem dos Médicos, nomeadamente no que toca à potencial perda da autonomia dada a Enfermeiros Especialistas de Saúde Materna e Obstétrica (EESMO), incluindo a possibilidade de internarem as grávidas. Antes de mais, gostaríamos de fazer notar que estas ações já acontecem na prática no dia-a-dia das maternidades portuguesas. Sublinhamos que uma maior autonomia dos nossos/as enfermeiros/as especialistas coloca Portugal ao nível das melhores práticas que, de resto, se observam na grande maioria dos países europeus, com melhores indicadores perinatais que os nossos, nomeadamente o Luxemburgo, a Suécia, a Noruega, a Finlândia, a Islândia ou a Suíça, para mencionar apenas alguns. De resto, de acordo com o número 4 das Recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para uma Experiência de Parto Positiva (2018), o modelo de continuidade de cuidados deve ser liderado por parteiras, (no nosso caso, ESMO), na gravidez, parto e puerpério — recomendações essas que devem ser seguidas pelos serviços de saúde em Portugal, por força do número 6 do artigo 15.o-F da Lei n.o 110/2019, de 9 de setembro.


Na visão da APDMGP, uma maior autonomia dos EESMOs pode ser a chave para se baixarem as nossas crescentes taxas de intervenção no parto e a nossa preocupante taxa de mortalidade materna, que tem subido nos últimos anos, colocando os enfermeiros e enfermeiras encarregues de assistir a partos fisiológicos de baixo risco — medida que a evidência internacional demonstra ser mais segura para mães e bebés— não os sobrecarregando com intervenções de rotina que sejam desnecessárias, e libertando os/as obstetras para casos de risco que efetivamente necessitam de monitorização médica e eventual intervenção.


Lamentamos profundamente a posição da Ordem dos Médicos (OM), que desvaloriza o trabalho da Comissão de Acompanhamento — onde, tanto quanto se sabe, a OM participou — e a importância da colaboração entre representantes dos vários profissionais envolvidos no trabalho de parto. Neste sentido, vimos reforçar o nosso apelo para que a Orientação 2/2023 da Direção-Geral da Saúde (DGS) não seja alterada ou revogada. Lamentamos também o forte corporativismo que se tem vindo a sentir por parte da OM, em desrespeito das competências próprias dos Enfermeiros Especialistas, e para prejuízo dos/as utentes que beneficiam da atividade autónoma e respeitada de cada profissional de saúde nas suas competências próprias.


Por último, questionamos a legitimidade da Ordem dos Médicos para impor a alteração de um trabalho feito sob a tutela da DGS onde a própria OM colaborou, tendo estado presentes vários elementos desta Ordem Profissional na sua coordenação científica, bem como muitas outras entidades que consideramos ser importante relembrar:

  • Comissão de Acompanhamento da Resposta em Urgência de Ginecologia/Obstetrícia e
    Bloco de Partos – Diogo Ayres de Campos;
    www.associacaogravidezeparto.pt geral@associacaogravidezeparto.pt
  • Secção de Neonatologia do Colégio da Especialidade de Pediatria da Ordem dos Médicos –
    Daniel Virella Gomes;
  • Colégio da Especialidade de Anestesiologia da Ordem dos Médicos – Joana Mourão;
  • Colégio da Especialidade de Obstetrícia e Ginecologia da Ordem dos Médicos – Maria do
    Céu Almeida, Cristina Guerreiro;
  • Colégio da Especialidade de Enfermagem de Saúde Materna e Obstétrica da Ordem dos
    Enfermeiros – Alexandrina Ramos Cardoso, Irene Cerejeira;
  • Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal – Nuno Clode;
  • Associação Portuguesa de Enfermeiros Obstetras – Vítor Varela, Isabel Ferreira;
  • Sociedade Portuguesa de Neonatologia – Cármen Carvalho, Gabriela Mimoso;
  • Divisão de Saúde Sexual, Reprodutiva, Infantil e Juvenil da Direção-Geral da Saúde – Susana
    Santo e Dina Oliveira.

Receamos que estes últimos desenvolvimentos, somados ao encerramento de maternidades no período do Verão, de acordo com o plano “Nascer em Segurança no SNS Verão 2023”, sejam mais um fator de instabilidade a agravar o estado de ansiedade e a insegurança das mulheres relativamente aos seus processos reprodutivos.


Firmamos a nossa posição de que nenhuma entidade deve ter, de forma isolada e contrária às restantes, a possibilidade de desvirtuar um processo que reúne o contributo e o trabalho de várias entidades que representam os profissionais que assistem as mulheres durante a gravidez e parto.


APDMGP confia que as entidades competentes terão o melhor interesse das utentes e suas famílias aquando destas tomadas de decisão, reiterando a sua disponibilidade e interesse para participar neste processo como ONG representante da sociedade civil.