Entrevista a Barbara Harper

“O parto na água é controverso porque é mal compreendido. Permite que a mulher recupere o controlo do seu processo de parto e isso é assustador para as pessoas que o querem controlar”


Depois de se ter formado em Enfermagem, nos Estados Unidos da América, Barbara Harper dedicou a sua vida ao parto natural na água e tem revolucionado hospitais e centros de parto em todo o mundo. Fundadora do Gentle Birth Consultants, em 1984, e da Waterbirth International, em 1988, Barbara é uma lenda viva, que continua a inspirar médicos e parteiras em dezenas de países a compreender o nascimento na água.


Aos 73 anos, Barbara viaja constantemente para ajudar milhares de pessoas a criar experiências de parto mais prazerosas e saudáveis para mulheres e bebés. Com um estilo inconfundível e uma capacidade única para transmitir informação científica ao mesmo tempo que mantém um coração gentil e atencioso, Barbara já deu formação também em vários hospitais portugueses, a convite da APDMGP. No entanto, nenhum deles conseguiu, ainda, implementar o parto na água. Falámos com Barbara Harper para conhecer melhor as suas motivações e perceber a importância de nascer em ambientes aquáticos e não só.

Barbara, porquê o parto na água? Como aconteceu? Teve alguma experiência no passado?

A minha introdução ao parto na água foi com uma paciente. Era enfermeira e trabalhava com um médico em práticas de medicina holística. Uma paciente que estava grávida entrou e disse que queria um parto na água. E eu apenas lhe perguntei: como se faz isso? (risos) Nunca tinha ouvido falar, não tinha noção nem qualquer experiência. Então, mostrou-me um artigo. Era uma espécie de jornal, daqueles em que não se confia, mas tinha uma fotografia de uma mulher, na Rússia, numa banheira de vidro, com um bebé entre as pernas. E o cordão umbilical estava lá. Olhei e pensei: ‘ok, o feto cresce em líquido, sai com líquido, o que poderá isto ter de mal?’ Mas tive de pesquisar e ela foi a minha primeira experiência. Liguei de volta e disse-lhe: ‘se quiser, eu ajudo-a’. E então comprei uma banheira, que foi usada para o seu parto, e projectei tudo para que ela pudesse ter um parto na água. Pessoalmente, gastei algum dinheiro e ao mesmo tempo também pesquisava. Ia a livrarias de medicina e fui à UCLA (Universidade da Califórnia, em Los Angeles) e comecei a telefonar às pessoas: ‘já ouviram falar disto?’ Encontrei três pessoas (risos) que de facto já tinham ouvido falar. E a partir daí, dei-lhe assistência. Não no parto propriamente dito, mas preparei tudo. O parto dela foi bem sucedido e nove meses mais tarde eu dava à luz do meu segundo filho, na água, usando o que aprendi com ela. Mas durante a minha gravidez também fui a França. Fui a uma clínica, em Pithiviers, nos arredores de Paris, porque tinha ouvido dizer que lá faziam partos na água. Encontrei-me com o Michel Odent e com o Frédérick Leboyer, faziam partos na água e passei 3 semanas perto de Paris a estudar e a aprender com eles. Fui a aulas de preparação para o parto, no Hospital Des Lilas, e regressei aos Estados Unidos completamente convicta de que isto era normal, natural, fácil e totalmente seguro. Falei com uma mulher que fez um parto na água, já tinha um exemplo na minha cidade natal, em Santa Bárbara, por isso estava preparada para criar essa experiência, mas não para mim! Estava a criar essa experiência para o meu bebé. 

Mas estava grávida nessa altura? Em que ano foi? 

Estava grávida, sim, do meu segundo filho. Foi em 1984.

E o parto do seu primeiro filho, foi fácil ou não?

Teria sido fácil se tivesse ficado em casa. (risos) Mas fui para um hospital demasiado cedo e chamo-lhe ‘o meu parto traumatizante’. Era o que toda a gente sabia, em 1978. Trabalhei no mesmo hospital onde dei à luz, era enfermeira, com um alto cargo de chefia, mas quando cheguei em trabalho de parto, eles pensaram que eu não sabia nada. Deitaram-me imediatamente numa marquesa durante todo o trabalho de parto e não me deixaram mexer, sair para apanhar ar, nem sequer ir à casa de banho. Trataram-me como a qualquer outra paciente e eu só dizia: ‘deixem-me sair, deixem-me levantar’! E foi por causa desse parto que hoje faço o que faço.

E isso também  fez mudar a sua visão sobre o nascimento. A sua avó também era parteira…

A minha avó era parteira e eu sabia como os bebés entravam e saíam. (risos) Era senso comum e toda a gente sabia que era assim que as mulheres faziam. Mas também tive uma experiência com um nascimento, quando tinha quase 14 anos, que foi difícil para mim. A minha mãe estava grávida e prestes a ter o quinto filho, eu fui a quarta, por isso havia um intervalo de 14 anos. A minha avó ainda estava viva, mas doente, tinha cancro, e a minha mãe foi para o hospital sozinha. O meu pai estava a trabalhar noutra cidade, por isso não podia estar lá, e a minha mãe ficou sozinha. Não me deixaram ir com ela, por ter menos de 16 anos, e fui impedida de entrar, até mesmo na porta principal do hospital. Isso foi muito difícil, porque eu e a minha mãe éramos muito próximas. Quando o meu irmão nasceu, foi um parto natural normal, não foi cesariana. Subi para uma caixa, fora da sala de partos, ao ar livre, e olhei pela janela. As enfermeiras levantaram o meu irmão para eu o poder ver, mas foi a única maneira de o ver e não pude ver a minha mãe. Por isso, foi pura tortura e eu sabia a 100% que isso estava errado. Então, quando entrei para o curso de Enfermagem como área de estudo, na saúde materno-infantil e puericultura, tudo surgiu com naturalidade. Mas quando comecei a exercer e a trabalhar no hospital, mais uma vez foi uma tortura. Sabia que o que fazíamos era errado, mas não era fácil dizer ‘o que vocês fazem aqui prejudica as mães, as famílias, a sociedade, e especialmente o recém-nascido, o bebé’. Por isso, fui expulsa muito rapidamente da enfermagem obstétrica (risos), porque estava sempre a questionar e a dizer: ‘porque o fazem desta forma? Porque têm de levar o bebé para o berçário? Porque é que a mãe não pode ficar com o bebé?’ Nessa altura, segundo as regras, devíamos cortar imediatamente o cordão, levar o bebé como se fosse um produto e a mãe não tinha nenhum direito a ele. O hospital tinha de o guardar, de o manter e de tomar conta dele. Tudo isto por boas razões, nas suas mentes, mas, para mim, era uma aberração da natureza. Cresci numa quinta e não só vi a minha avó que fazia todos os partos em casa (só mais tarde, nos anos 60 e 70 é que já era no hospital), mas vi também o nascimento de gatos, cães, vacas, ovelhas e cavalos e só pensava que estávamos, de facto, a fazer uma coisa que interrompia o processo natural e que tínhamos de perceber como podíamos fazê-lo melhor.

Porque é que o parto na água ainda é tão controverso?

Em primeiro lugar, o parto na água é controverso porque é mal compreendido. Permite que a mulher recupere o controlo do seu processo de parto e isso é assustador para as pessoas que o querem controlar. Quando vemos uma mulher completamente relaxada, que adormece entre as contrações, que se movimenta da forma que o seu corpo precisa, quando não estamos habituados a isso, é como uma ameaça. Implementámos protocolos de gestão de risco hospitalar nos cuidados maternos com medidas muito restritivas, fizeram-se regras, regulamentos, calendários, e o parto na água de repente diz-nos: ‘esqueçam isso, deixem a natureza desempenhar o seu papel e deixem os bebés sair de forma adequada’. Isto assusta as enfermeiras! Quando dou cursos e elas vêem realmente o aspecto do bebé, que não se afogou, e como a mãe se sente e expressa os seus comportamentos primários através dos seus instintos, isso estimula-as a pensar: ‘ah, se ela pode fazer isto, o que temos nós andado a fazer’? E na verdade penso que o parto na água ameaça a norma, mas também observo e constato que quando se introduz a água, as outras práticas começam a mudar. As parteiras que fazem os meus cursos aprendem a ser pacientes, a deixar o bebé emergir, sem a ajuda das mãos a manipular a cabeça do bebé ou a tocar no períneo, e quando vêem isso na água, ficam capazes de transferir esse conhecimento para a cama. E então recebo cartas e e-mails de parteiras a dizer: ‘Oh meu Deus, Barbara, eu consegui manter as mãos afastadas do bebé e nem sequer foi um parto na água!’ E isso liberta os protocolos, portanto é mal compreendido. O parto na água é mal compreendido porque se pensa que vai ameaçar o bem-estar e a vida do bebé.

Portanto, se a natureza já faz isto há milénios, no século XXI, principalmente graças à ciência, porque é que há tanta intervenção nos Hospitais?

(risos) Um médico em Chicago, que assistiu a um dos meus seminários, disse o seguinte: ‘Portanto, Sra. Harper, o que acabei de aprender consigo é que eu não preciso de controlar nada; não tenho de fazer um exame vaginal; o bebé vai sair quando chegar a hora dele; não tenho que fazer o parto; será que entendi bem?’ Sim!, respondi. ‘E não tenho que cortar o cordão; ele vai pulsar, a placenta descola-se sozinha, o bebé vai ficar bem desde que esteja no peito da mãe e por isso não tenho que fazer nada ao bebé; não tenho que o secar, não tenho que o aspirar, não tenho que cortar o cordão, não tenho que tirar o bebé, e a mãe e o bebé podem até ir para casa com a placenta ainda presa ao bebé; será que ouvi correctamente?’ Sim!, respondi novamente. ‘Então, Sra. Harper, se tudo isso for verdade, como vou justificar os meus honorários se não faço nada?’, perguntou. Olhei para o céu e pedi a Deus: ‘por favor, dá-me uma boa resposta’. (risos) E então, disse: ‘O nadador-salvador que vigia a praia, só vai ser pago se salvar alguém?’ E todos na sala começaram a aplaudir! Então, foi assim que  consegui transmitir a esse médico: ‘O senhor foi para a faculdade de medicina para conseguir saber quando deve intervir se houver algum problema. Você é um salva-vidas, está lá para garantir segurança, para ouvir o ritmo cardíaco do bebé durante o trabalho de parto e assegurar que o feto está saudável. Se algo acontecer que não garanta ao bebé um bom trabalho de parto, então poderá mudar a situação ou fazer uma intervenção, administrar uma medicação, fazer algo para mudar essa situação. Mas primeiro, tem de saber as características do que é o normal e a água cria essa normalidade’. Quando o Royal College of Midwives (Real Colégio de Parteiras) se reuniu com o Royal College of Obstetricians (Real Colégio de Obstetras), no Reino Unido, em 2007, debateram-se uma série de questões que contribuíram para a expansão da normalidade do parto, e a primeira coisa em que ambos concordaram e que escreveram num position paper (ensaio), foi que o uso de água para imersão terapêutica durante o trabalho de parto e o parto normal, aumenta os benefícios do parto, além-fronteiras, sem qualquer tipo de risco evidente.

Então, por que razão continuam a propagar coisas negativas sobre o parto na água? Estão desinformados?

O conhecimento do parto natural normal não é ensinado. Formei-me na escola de enfermagem, há décadas, há mais de 40 anos. Quando estudei o parto normal ainda não havia epidural, nem monitores fetais e a taxa de cesarianas era de 5%. Portanto, sim, ainda se fazia parto natural normal, mas não tínhamos as peças reunidas para perceber o impacto disto na espécie humana. A intervenção e a interrupção vieram causar a este novo ser humano ou o bem-estar ou possíveis danos à sua saúde para toda a vida, a vitalidade e o bem-estar emocional, físico, imunológico, neurológico. O parto tem um enorme impacto sobre isso e nós víamos essa ligação. E agora temos a oportunidade de a ver através da investigação científica, da neurologia pediátrica, da microbiologia, de tudo o que se tem estudado actualmente. Mas os nossos livros de medicina estão 25 anos atrás. Lembro-me de estar frente a uma audiência numa escola de medicina no México, a disciplina era obrigatória, e todos os residentes de todas as escolas de medicina tinham que assistir ao meu seminário. Durou três dias e foram acreditados por isso. As mãos levantavam-se e os alunos diziam: ‘mas não foi isso que nos ensinaram! Ensinaram-nos que temos de clampear e cortar o cordão de imediato, senão o bebé terá demasiado sangue’. Então, eu disse-lhes: ‘eu compreendo que vocês não queiram ofender os vossos professores, estariam a desconsiderá-los. É uma situação difícil. Passa-se o mesmo na China, na Venezuela ou no Brasil. Vocês vão para uma escola de medicina e quando saem vão professar o que vos foi ensinado. E estão tão ocupadas a cuidar das mulheres que não se sentam à noite a ler artigos de investigação recentes, e nem sequer têm tempo para a vossa vida privada quando são obstetras ou parteiras com muito trabalho. Não se vão sentar a ler 25 revistas sobre fisiologia neonatal, microbiologia, obstetrícia, parteiras, enfermagem, psicologia, todas as coisas relacionadas com este processo do nascimento. Portanto, vocês farão o que a vossa experiência vos tem ensinado. E as experiências que se ensinam nas escolas de medicina em todo o mundo são uma aberração à normalidade. Não são partos normais, são:  ‘é assim que se tira um bebé; há 63 passos de A a Z e de AA a ZZ; têm de seguir este protocolo’. E se não seguirem este protocolo e cometerem um erro, vai pesar-vos na consciência. E há tanto medo à volta do nascimento, porque cada um de nós, em todo o planeta, passou por essa experiência em que fomos cortados e separados das nossas mães; e temos este conhecimento profundo da dor e do pesar de termos sido afastados’. Sei que é outra questão que precisa de ser abordada, mas como seres humanos, fomos separados, separados e separados durante tanto tempo que o consideramos normal! Vivemos com hipertensão e doenças cardiovasculares e a diabetes e todas essas coisas que semeiam os seus grãos, doenças mentais e adicções, e estas sementes germinam durante o processo do nascimento e da separação.
 

Quero voltar mais tarde ao processo de nascimento, mas para começar, porque é que tantas mulheres têm medo do parto? Porque é que isto acontece?

As mulheres têm medo do parto porque nasceram no medo. A mãe era forçada a dar à luz e depois eram separados. E essa angústia de ter nascido num clima de medo extremo, ansiedade, terror, e as coisas que fizemos aos bebés que nós, quero dizer, mulheres da sua idade, mulheres entre os 25 e os 30 anos que estão agora a ter bebés… pegámos nesses bebés e pusemo-los em “caixas” de plástico e demos-lhes biberões e tudo mais. Mesmo quando uma mulher tinha um parto normal e natural, mesmo um parto vaginal normal, não era total e completamente natural. Às vezes ouço mulheres que não têm medo de parir porque viram a mãe a ter um parto normal e natural em casa, ou sabem que nasceram de uma forma fácil. E digo-lhes com frequência: ‘antes de irem às aulas de preparação para o parto, tentem saber o que a vossa mãe sentia, pensava, e quais eram as emoções dela quando estava grávida de vocês, porque se aquela mãe estava com medo e receosa de dar à luz, isso instala-se no cérebro desse ser humano e repercute-se numa situação idêntica. Chama-se a isso mapeamento genético. É a transmissão da angústia e da ansiedade que se instala no cérebro durante a gravidez. A partir das 20 semanas de gestação, o nosso sistema neurológico está conectado às emoções da mãe, aos seus sentimentos, aos seus comportamentos.

Também disse que nós temos um tipo de memória nas células no momento em que nascemos.

O nosso corpo, a nossa fáscia, a nossa consciência, a nossa neurologia, tudo isso memoriza o nosso nascimento. Não é preciso muito para pôr uma mulher em hipnose através da respiração, para se lembrar, para o marido se lembrar, para qualquer um de nós, como seres humanos, nos lembrarmos do momento do nosso nascimento. E se alguém gritar connosco, se alguém gritar com a mãe: ‘vá, vá, não é assim, força, força, faça força, agora, agora, puxe, puxe’… Isso stressa a mãe! O bebé vai sair de uma maneira ou de outra, mas, do nada, stressamos a mãe, o seu corpo fica cheio de cortisol e, obviamente, de hormonas que interrompem o processo natural e, assim, o bebé nasce num estado de grande ansiedade. Esta é a teoria do mapeamento genético que está comprovada em muitos estudos. 

As mulheres estão a perder autoconfiança? Hoje em dia há mulheres que pedem para marcar uma cesariana.

Em outubro de 2015, estive em Alexandria, no Egipto, onde fiz uma apresentação e alguns workshops, numa conferência PAN-Africana, e todas as pessoas do Egipto e do Norte de África falaram sobre as elevadas taxas de cesariana, especialmente no Egipto. Eu estava em estado de choque – e já não me podem chocar mais quando as taxas de cesariana são acima dos 70% ou dos 80% – mas é isso que está a acontecer em todo o mundo. Na Índia, nos hospitais privados, as taxas de cesariana rondam os 85%; Brasil, Argentina, China, 70%. Por isso, quando soube que no Cairo era de 79%, não fiquei surpreendida. Mas os médicos, na conferência, perguntaram: ‘Porquê, porquê, porquê?’ Em vez de: ‘Como resolver isto? E porque é que as mulheres pedem para fazer cesarianas?’ Então, tive a atenção de alguns médicos e disse-lhes: ‘Vou dizer-vos exactamente porquê. Por favor, ouçam isto. Por trás da porta A, há uma mulher que tem uma experiência de abuso mental, físico e emocional, vocês são impositivos, não a deixam confiar no seu corpo, não a deixam confiar no seu bebé; dizem-lhe quando ela deve dar à luz, como deve dar à luz, tratam-na como se fosse uma criança despojada de todos os seus direitos humanos de auto-determinação, ignoram completamente que o bebé é um participante consciente e que tem uma motivação neurológica, emocional e espiritual para nascer, tiram a dignidade a esta mulher e tratam-na como se fosse, não só uma criança, mas também como se tivesse uma patologia médica. E se ela não o estiver a fazer bem, então, dão-lhe drogas para acelerar; se estiver a ir demasiado depressa dão-lhe drogas para abrandar; e ela ouve isto da mãe, da irmã, das amigas, das tias, na imprensa e nas publicações, na televisão e no cinema, é isso que as mulheres vêem. E elas não querem isso! E por trás da porta B, oferecem-lhe uma cirurgia de 20 minutos. E isso é doloroso e permanece durante 2 meses, 3 meses, 6 meses ou um ano, e aumenta o risco de mortalidade materna a cada gestação, mas são apenas 20 minutos! E então ela vai aceitar o menor de dois males. Até reconhecerem a primazia do nascimento e darem apoio a este processo inato de dar à luz, que tanto a mãe como o bebé têm, as mulheres continuarão a escolher o parto por cesariana’. 

Com que frequência é que as mulheres que tiveram uma má experiência de parto no hospital optam depois por um parto na água?

A maioria das mulheres acorda depois do primeiro parto. E mesmo que tivessem uma experiência de alguma forma decente, não muito longa, podem ter amamentado durante 2 ou 3 meses, há algo nelas que diz: ‘hum, eu poderia ter feito melhor, talvez seja melhor ler algumas coisas, não li nada porque o meu obstetra disse que não precisava de ler nada, que apenas confiasse nele’. E os obstetras não são más pessoas. Não conheço uma única enfermeira, uma única parteira ou um único obstetra que se tenha levantado esta manhã e dissesse: ‘oh, hoje vou ao hospital e vou torturar mulheres e bebés’. Eles não fazem isso, há um altruísmo em ser obstetra ou ser parteira. ‘Estou a fazer um trabalho muito importante, mas esta é a forma como me ensinaram e não conheço outra. Não sinto segurança a fazê-lo de outra forma e é preciso tê-la, é preciso ver para acreditar’. Ainda hoje, quando mostro os meus filmes e dou um workshop onde se vê a cabeça do bebé no períneo, a virar automaticamente após cinco minutos de espera, os médicos, as parteiras e o público fazem: ‘Ah, oh meu Deus, nunca tinha visto isto!’ Porque nunca ninguém tem paciência para esperar que o bebé faça o que está neurologicamente programado para fazer. E estas são boas parteiras, são as que passaram nos exames, são licenciadas e têm prática hospitalar. 

Mas, ao mesmo tempo, têm todo este peso do sistema e é difícil lutar contra ele. Conhece o caso de Setúbal? Havia um hospital em Portugal onde se faziam partos na água e agora isso já não é possível.  

Visitei o Hospital de Setúbal em 2014, fiz lá uma pequena apresentação, pendurei um caça-sonhos por cima da banheira e disse: ‘isto é o meu sonho, é a minha paixão, fazer do parto na água uma opção para todas as mulheres em todos os hospitais de Portugal, para que todas as mulheres que queiram dar à luz se sintam seguras e bem-vindas’. Há tanto que se pode fazer para mudar o contexto, os resultados, podemos melhorar a saúde e a vitalidade de todos os cidadãos de Portugal, ter menos violência, podemos ter menos constipações e gripes, menos diabetes, menos doenças cardiovasculares, menos hipertensão… basta apenas compreender a importância dos bons cuidados pré-natais e da educação na assistência ao parto, encorajando e apoiando estas mulheres a parir. Sim, existem normas governamentais que precisam de ser alteradas. Sim, a educação pública precisa de ser melhorada. E sim, haverá alguns médicos que se deveriam reformar e não continuarem a praticar, porque não querem mudar. Mas já vi mudanças em alguns sítios e já vi melhorias a acontecer. A China é um dos países que está a mudar rapidamente. É inacreditável, estão a fazer enormes progressos, estão a compreender e a conseguir. 

Mas não foi esse o caso aqui em Portugal.  

Penso que o ambiente nos hospitais de Portugal está a mudar favoravelmente para o parto na água. O incidente no Hospital de Setúbal é que estavam a fazer o parto na água e depois foi interrompido. Porém, eles disseram que se podia fazer o trabalho de parto na água, podia haver imersão na água, mas não se podia dar à luz na água. E isso aconteceu na mesma altura em que o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG) divulgou um artigo de opinião sobre os potenciais perigos do nascimento na água. O ACOG contratou uma empresa de comunicação social para divulgar essa mensagem. Embora não fosse no Hospital de Setúbal, alguns obstetras em Portugal leram o artigo de opinião e sugeriram ao departamento de saúde que qualquer prática de parto na água deveria ser suspensa até nova ordem. Uma parte do problema foi a reacção a um parecer que os obstetras nos EUA tinham publicado. Não foi um parecer científico, foi um artigo de opinião! E esses mesmos médicos, dos EUA, sempre mantiveram essa opinião, desde que o parto na água começou. 

E baseiam-se em quê?

Em nada! Na opinião deles. (risos) Fizeram-no para uma revista literária, era um comité sobre o feto e o recém-nascido, para a Academia Americana de Pediatria e para o Colégio Americano de Obstetras. Em 1995, escrevi ao Colégio de Obstetras e enviei-lhes um paperwork onde dizia: ‘Estes são os estudos científicos, predominantemente da Europa, porque o Reino Unido reconhece que o parto na água deverá ser uma opção disponível para todas as mulheres, do sistema de saúde do Reino Unido, e mantêm um registo dos seus dados, publicam regularmente, foram analisados 8.915 partos na água, ao longo de cinco anos, pelo que têm lá muitos investigadores’. Então, enviei um pacote com artigos para o comité de prática pediátrica, com uma carta solicitando um parecer. Eles responderam, ainda tenho essa carta, e disseram que, até essa altura, quando há grandes estudos populacionais (10.000 mulheres ou mais) publicados em peer-reviewed journals nos EUA, esses estudos são feitos em ensaios de controlo randomizados. Por outras palavras, 10.000 mulheres que dão à luz na água e 10.000 mulheres que não dão à luz na água. Portanto, são necessárias 20.000 mulheres para satisfazer a curiosidade deles, e é preciso distribuir aleatoriamente essas mulheres. Você tem um parto na água, você não tem, você tem um parto na água, você não tem. Isto, é um ensaio clínico randomizado, controlado por um grupo de controlo, e depois distribui aleatoriamente as mulheres, ou para o grupo de controlo, ou para o grupo experimental. Eles disseram que o parto na água apenas seria possível, em práticas experimentais, no âmbito dessas experiências de controlo aleatório. Esta era a opinião deles em 1995 e essa era a mesma opinião em 2005, quando escreveram um artigo sobre o assunto e o publicaram. Essa era a mesma opinião em 2012 e essa era a mesma opinião em 2014. Mas em 2014, tinham uma agência de comunicação e publicaram esse parecer na Internet, no Today Show, no New York Times, e foi uma reacção directa ao facto de, nos EUA, os nascimentos em casa terem aumentado cerca de 400%. E os obstetras disseram: ‘Bem, vamos lutar contra esta coisa dos nascimentos em casa, porque todas fazem partos em casa para ter partos na água, portanto, vamos falar mal disto’. Eles não disseram isto abertamente, mas houve uma espécie de contra-corrente de ‘Vamos fazer com que as parteiras fiquem mal vistas e atacar a principal ferramenta delas, a imersão na água e o parto na água, a única ferramenta para a gestão não medicamentosa da dor e do conforto, vamos falar mal disso’.
 

Sim, a mesma coisa está a acontecer aqui em Portugal. Não há muito tempo, passou uma notícia que mostrava o quão mau pode ser um nascimento em casa. Mas realmente é triste que uma mulher que queira ter um parto natural não o possa fazer no hospital.

No hospital, não. E uma parte do meu trabalho, nos hospitais dos EUA, é dar orientações sobre como iniciar centros de parto natural em ambiente hospitalar. Pegamos em cinco salas de parto, por exemplo. Numa delas, tiramos o monitor, mudamos a decoração e rastreamos pacientes, para que a mulher com uma gravidez fisiologicamente normal, que queira ter um parto fisiológico natural, seja autorizada a entrar naquela sala. E, nessa altura, ela é apoiada com todos os cuidados personalizados, é apoiada com uma doula, com uma bola de parto, um banco de parto, uma banheira, e nada mais é usado para a gestão da dor ou gestão do conforto. Pode andar livremente, pode comer, pode beber, pode parir em qualquer posição que queira. E quando as enfermeiras estão preparadas e se começa a fazer isso, naquele ambiente hospitalar, se alguma coisa correr mal durante o parto, a parturiente é simplesmente transportada desta sala para a seguinte, que tem o monitor, o suporte intravenoso, os procedimentos médicos, a epidural. Assim, é possível, em qualquer hospital e em qualquer parte do mundo, treinar parteiras e obstetras para darem apoio durante o parto natural vaginal, o parto sem perturbações, e verão os resultados a mudar. Deste modo, qualquer hospital pode fazer isso. Eu visitei um hospital no norte de Portugal [Póvoa de Varzim], onde fiz uma pequena apresentação, e eles já estão a fazer isso. Já permitem que as mulheres dêem à luz em qualquer posição, nos bancos de parto, na bola de parto, de cócoras, com aulas de parto vibrantes e maravilhosas e também dão aulas de natação pré-natal. Eu fiquei tão entusiasmada ao falar com elas que disse: ‘Oh, o próximo passo é o parto na água!’ E elas exclamaram: ‘Sim, sim, sim! Mas não temos piscina. E eu disse: ‘Eu mando-vos uma! (risos) E a Waterbirth International vai doar uma piscina para aquele hospital. 

Como é que os hospitais lutam contra o governo e todos os protocolos que têm de seguir?

Podemos usar as directrizes do sistema de saúde pública do Royal College of Obstetricians e do Royal College of Midwives do Reino Unido, que diz que toda a mulher merece ter uma gestão não farmacológica da dor. A melhor forma de gestão não farmacológica da dor é a imersão na água e, de facto, o governo britânico apoia a educação e a formação dos médicos, parteiras e enfermeiras, nesse sistema. Podemos usar isso, podemos usar as recomendações gerais da Organização Mundial para o Parto Natural, podemos recorrer às directrizes dos Direitos Humanos para o Nascimento e para a Liberdade das Mulheres; podemos usar as organizações Childbirth Connection e Childbirth International Education Association. Temos tantos dados publicados que basta procurar e fazer uma breve apresentação à legislação, aqui em Portugal, e dizer: ‘Aqui estão os dados. Vejam-nos. Não estamos a fazer nada que seja contra a segurança e o conhecimento do parto natural’.

Substituiria todas as camas de parto por banheiras?

Ainda precisa de uma cama! (risos) Se possível, colocaria banheiras em todos os quartos, mas podemos começar com uma e ver qual é a utilização. É o que eu sempre digo ao hospital. Comece com uma piscina e veja com que frequência a utiliza. Porque as mulheres vão continuar a pedi-la, vão entrar e dizer que viram na internet ou na televisão. Nos EUA há uma novela mexicana e a meio há um parto na água. (risos) Por isso, está em todo o mundo. As mulheres vêem isso e até eu fico surpreendida. Na verdade, até não, porque foi sempre a minha visão. Há mais de 40 anos foi sempre a minha visão de que floresceria e aconteceria. Uma vez, tive um sonho. Estava num parque, com os meus filhos, o meu filho mais novo ainda era um bebé. Deitámo-nos para o amamentar e adormeci. Enquanto dormia tive este sonho de que o parto na água se tornaria a norma e que aconteceria num curto período de 50 anos (risos) e em todo o lado, em todos os cantos do planeta… E isso é provavelmente a duração da minha vida, porque tenho 73 e gostaria de ver este sonho a acontecer. E está a acontecer, em todo o lado. Já dei aulas em 60 países e vejo mudanças em todos os lugares onde estive.
 

Qual é a parte mais difícil do seu trabalho? 

Não olho para as coisas negativas, mas a parte mais difícil do meu trabalho é a preparação necessária à sua realização, as longas horas de recolha e actualização de dados científicos para garantir que tudo o que digo está correcto, que é viável e que posso ‘pregar’. (risos) Posso falar em frente de qualquer audiência, em qualquer lugar, e ter um intérprete em qualquer língua, estou bem com isso, mas quero ter a certeza de que tudo o que digo é autêntico. Continuo a dar assistência a partos só para manter as minhas mãos ocupadas. As mulheres perguntam-me: ‘Pode vir ao meu parto? Pode estar lá?’ E se eu puder encaixá-lo na agenda, sim, vou. Penso que a outra parte mais difícil é saber que ainda não atingimos o marco dos 50 anos, que ainda temos mais 13 pela frente. E a parte ainda mais difícil, para mim, é pedir às pessoas que me ajudem. 

E mudar mentalidades…

Está a acontecer. Primeiro, tem de mudar o coração e depois a mente. Não quero ser lembrada por introduzir o parto na água nos Estados Unidos. Houve centenas de pessoas que o fizeram antes de mim. Em 1902, num livro de medicina, está escrito: ‘Se não tiver um banho quente no trabalho de parto, considere o parto anómalo’. Num livro de medicina de 1902! O primeiro artigo escrito sobre o parto na água foi em 1803! Já existe há séculos. Encontrei uma tribo na selva do Panamá, na fronteira da Costa-Rica, e elas dão à luz no rio, há milénios, mas ninguém ouviu falar disso porque não saem de lá. Na África Ocidental, no Gana, nasciam no oceano; o povo de Ohio nascia nas bacias e piscinas aquecidas por geotermia. Portanto, já existe há muito tempo.

Portanto, nós apenas…

Temos que respeitar a natureza. Não há como retroceder. Estamos em evolução, o tempo não se esgota, evolui. Entramos nesta espiral e o que aqui acontece, quando nos aproximamos da próxima espiral, somos uma pessoa diferente porque ouvimos uma vibração, uma energia superior. Basta um determinado número de pessoas para alcançar uma determinada vibração e antes que tudo possa mudar, PUM (faz um som forte batendo as mãos), é como um cataclismo que vai libertar tudo e sair destes modelos patriarcais para dizer: ‘Vamos lá pessoal, vamos cooperar, vamos respeitar a natureza, vamos respeitar o solo, vamos respeitar o ambiente’. E isso vai acabar por acontecer. 

No que diz respeito ao processo de nascimento, quando os médicos dizem às mulheres grávidas que devem fazer uma cesariana, fundamentada em mitos…

Tenho um capítulo inteiro no meu livro, de 2005, sobre isso, chamado “Dispelling the medical myths”. As mulheres ouvem esses mitos e às vezes choro à noite por causa disso. Choro mesmo! Nas minhas orações peço a Deus que perdoe esses médicos por inventarem estas coisas. Estive na Índia, e uma mulher fez uma cesariana porque o cordão estava à volta da mão do bebé! E o médico disse à mãe, ao pai, aos avós: ‘Vou salvar o bebé, o cordão está à volta da mão, felizmente podemos fazer uma cesariana’. E ela só esteve duas horas em trabalho de parto! Conheci um médico na Turquia, e um médico na China, e um médico no México, e um médico na Venezuela, e um médico no Brasil, e todos eles me disseram as mesmas coisas: ‘Não tenho tempo para esperar por um parto vaginal, tenho um quarto cheio de utentes, neste momento tenho 200 mulheres na clínica, e se esperasse por cada uma delas para ter o bebé não poderia fazer nenhum exame pré-natal. Portanto, posso fazer seis cesarianas de manhã, ver todas as minhas utentes, fazer seis ou sete à noite, ir para casa, dormir, e voltar e fazer tudo de novo no dia seguinte’. Qual era a taxa das cesarianas? Ok, a taxa de cesarianas do médico da Turquia era de 95%; do médico do México era de 95%; do médico do Brasil a taxa era de 89%. Temos de viver com a realidade de que eles vão encontrar sempre uma desculpa. Na China, se tiver menos de 16 anos, fazem automaticamente cesariana, se tiver mais de 35 anos, automaticamente cesariana, se o cordão estiver à volta do pescoço, automaticamente cesariana, se o nível de líquido amniótico for inferior a 10, automaticamente cesariana. Estas coisas são inventadas. Não há absolutamente nenhuma ameaça contra a vida dos bebés por terem o cordão à volta do pescoço. Uma mulher com 35 anos ou mais pode parir sem qualquer problema, a sua vagina sofrer danos se tiver um parto vaginal. Na verdade, a cesariana prejudica, tanto ou mais, o pavimento pélvico. Portanto, há muitos equívocos que se provam estar errados quando se olha para a investigação. É preciso olhar para a investigação. Então, quais são os outros mitos que temos? 

Não é um mito, mas um facto, que quando um bebé nasce, especialmente por  cesariana, eles não o entregam logo à mãe. 

Não.

Têm que lhe fazer testes de rastreio, têm que o pesar, medir, limpar, vestir… porque é que isso ainda acontece?

Porque não consideraram a investigação. Nas cesarianas é ainda mais importante para o bebé atrasar o clampeamento do cordão e ir para o “santuário” [encosta as mãos no peito], o lugar sagrado onde o bebé está neurologicamente programado para se adaptar.

Porque é tão importante para o bebé estar com a mãe assim que nasce?

A forma como o cérebro humano evolui. Nascemos imaturos, todo o ser humano nasce antes de o seu cérebro estar completamente desenvolvido. Tem que ser assim, devido ao tamanho da nossa pélvis, temos de nascer imaturos. E o útero, o ventre materno, é o lugar que fornece a este novo ser humano oxigénio, nutrição, calor e protecção. O nascimento permite ao bebé sair do ambiente intra-uterino directamente para cima do peito da mãe, onde recebe calor e protecção, nutrição e oxigénio, tal como tinha no ventre materno. O bebé precisa de um útero externo, de um ‘ventre materno com vista’ para que o seu cérebro possa crescer e fazer as ligações necessárias logo desde o início, porque, se houver separação o cérebro não está programado para o desenvolvimento neurológico desse novo ser humano. 

Que efeitos podem ter estes momentos de separação na personalidade da pessoa, no futuro?

Todo o ser humano é programado com duas funções biológicas principais. O primeiro imperativo é nascer. Sabemos como nascer, sabemos como podemos estimular o nosso sistema neurológico, o sistema cardiovascular e passar de feto a recém-nascido. Sabemos como fazer isso. Também sabemos como subir para encontrar alimento, conseguimos gatinhar até ao mamilo, procurá-lo e agarrá-lo. E esse é o segundo imperativo biológico. Se afastarmos o bebé da mãe e não permitirmos que este segundo imperativo biológico aconteça, lavamos o bebé, vestimos o bebé, injectamos o bebé, aspiramos o bebé, fazemos todas essas coisas, antes de ele ter oportunidade de encontrar o seu lugar seguro, a que chamo o santuário, então o seu cérebro fica marcado pela separação. Se ele for a esses lugares, então o cérebro fica conectado para a ligação e ela diz: ‘a minha amígdala vai funcionar’; o meu nervo vago diz: ‘estou no lugar certo’! Os meus sentidos dizem: ‘estou a fazer o que é certo’! O meu sistema endócrino diz: ‘tudo está no tempo certo e na ordem certa! Agora, estou aqui e sou um ser humano total, pleno e completo’! Se pusermos o bebé no berçário e lhe dermos o biberão, ele sobreviverá, mas será um ser humano neurologicamente muito diferente. Será susceptível a incertezas, pressões externas, vai prosperar com medos. Terá as sementes, não de insatisfação, mas mais: ‘devo ter feito algo de errado, ninguém me ouve, ninguém me respeita’. E quando temos essa programação neurológica, a nossa vida não será vivida em pleno. A criança que vai para o santuário e é abraçada, honrada, acarinhada e nutrida nesse lugar, tem total confiança, tem o entendimento e o conhecimento. Cada célula do seu corpo está no ritmo do som do Universo. Nada está errado, porque o cérebro está unicamente programado para este lugar. É como tirar um bebé do útero antes de poder sobreviver e pô-lo no chão e dizer: ‘Ok, agora já estás bem’. Não, não está bem! Temos de manter o bebé num ambiente onde ele possa prosperar, não apenas sobreviver mas prosperar. Pensei ter inventado a palavra prosperidade (risos) em vez de sobrevivência, mas depois vi-a impressa num livro de Bruce Lipton e penso que muitos de nós chegámos a essa mesma conclusão ao mesmo tempo, de que há dois estados da mente e do corpo: uma quebra ou uma evolução. Se não estiver num estado de amor e apego, então fico num estado de medo e desapego, dissociação. Vou levar isto ao extremo: há muitas pessoas neste planeta que andam semi-vivas. São viciadas em drogas, álcool, tabaco, todo o tipo de coisas que têm impacto nos sistemas de saúde de todos os países. Têm doenças mentais, têm problemas emocionais, e podemos melhorar tudo isso pondo os bebés no santuário, independentemente da forma como nascem, vaginal ou cesariana, é a forma mais simples, mais fácil e sem custos envolvidos. Estou mais empenhada em pôr os bebés no santuário do que com o parto na água. Porque é uma resposta enormíssima! A presença do bebé neste lugar também estimula o cérebro da mãe, a sua glândula pituitária, ajuda-a mesmo na recuperação do parto mais difícil, permite a produção do seu leite materno, as suas hormonas voltam ao normal através do bebé, terá menos depressão pós-parto. Só há coisas boas a dizer sobre isto. Quando ensino isto na China e na Índia, nas minhas avaliações, pergunto: ‘Qual foi a coisa mais surpreendente que aprendeu neste curso’? E poderei estar a treiná-los para ensinar o parto na água e para aprenderem como fazer partos na água, mas sempre, não importa onde, no Médio Oriente, na Ásia, todas as pessoas dizem: ‘Não sabia que o contacto pele-a-pele pudesse ter tanto impacto’. Pele-a-pele. Quer dizer, estar aqui e ficar aqui. Podemos mesmo pegar no bebé mais pequeno, prematuro, e aumentar a taxa de sobrevivência em 90% por ter este bebé no lugar certo. Podemos regular o seu ritmo cardíaco, a respiração, os níveis de glicose, a temperatura da pele, esta é a incubadora original. Portanto, se há uma coisa que pode mudar os cuidados de saúde em todos os países do mundo é pôr o bebé no ‘santuário’ [pele-a-pele].

Então, porque não o fazem?
Não conhecem a informação! E podiam, a informação sobre o contacto  pele-a-pele está disponível, mas é preciso saber procurá-la e isso significa manter o cordão preso. Traz benefícios para o bebé e para todos os sistemas do bebé. Mas não é o que se ensina nas escolas de medicina, por isso… (risos).

Bárbara, para terminar, o que diria a uma mulher que está grávida e prestes a ser mãe?
Conheça as suas opções, leia o mais que puder, saiba como nasceu, saiba que foi escolhida. O seu filho tem consciência e escolheu-a como mãe. Essa é uma grande responsabilidade, mas também é a experiência espiritual mais transformadora que alguma vez encontrará. Por isso, saiba o que quer, peça-o, exija-o, e leve alguém consigo para lhe dar apoio a cada passo do caminho. 

Por Laura Ramos (Jornalista*)
*Não adopta o Acordo Ortográfico.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *